domingo, 23 de setembro de 2012

Crônica de Wagner Gomes

                                      O SONHO DE UM OREIA
    
 Mais um traçado. Só faltava isto para encher as sapatas. O Suor escorria pela testa, sua camisa ensopada estava grudada ao corpo. Afinal foram 12 massadas de concreto, os braços já estavam muito doloridos.
- Ei, Oreia, falta quinze pra meio dia. Vai buscar a marmita! Gritou o pedreiro.
- Já vou Seu Zé! Respondeu o jovem largando a enxada.
Sossegadamente caminhou até a torneira, girou a válvula, lavando as mãos e o rosto. Por fim, meteu a cabeça n’agua gelada, penteando os cabelos com a ponta dos dedos.
- Mas é uma febre tife, ô bicho da gota, vai buscar o de comer! Mais uma vez gritou o pedreiro.
- Sim, já estou indo!  Respondeu o rapaz saindo apressadamente.
Caminhando às pressas, tirou o celular do bolso, verificando aliviado: 12h: 02min. Já está na hora, pensou o jovem sentando numa pilha de tijolos na calçada. O prédio que estava construindo projetava uma maviosa sombra sobre os tijolos. Cansado, sentou-se.
Mal havia se aconchegado sobre os tijolos e já vinha o motivo de sua inquietação diária. Virando a esquina, seguia alegremente um trio de garotas, de um colégio próximo. O rapaz rapidamente deu um salto, fazendo uma pose, à la malandro, apoiando uma das mãos na cintura e outra na pilha de tijolos. Mas quase lhe faltavam forças nas pernas, quando o adocicado perfume penetrou em suas narinas.
A dona da sedutora fragrância era uma linda jovem de cabelos castanho-claro, olhos amendoados, e uma pele branca como leite. Seu uniforme de colegial propiciava pensamentos fetichistas, o que fazia o jovem ficar paralisado.
Psiu, Psiu! Era a única coisa que conseguia fazer após as jovens passarem por ele. Elas, por sua vez, retribuíam com modestos sorrisos, pequenas reboladas provocativas. Para o jovem era como ganhar o dia, aqueles pequenos flertes. Mas quando elas sumiam no fim da rua, a magia acabava. Ele voltava a ser um mulato, nordestino e servente de pedreiro. Nunca conseguiria namorar uma moça rica, nem mesmo pôde ir à escola, era apenas mais um oreia numa construção em São Paulo.

2 comentários:

  1. Grande captura da realidade. Um pouco preconceituoso, mas real. Quem nunca viu esta cena na vida? Parabéns Arauto Soturno! Um dos maiores poetas contemporâneos.
    P.S: Poderia postar os antigos sonetos do recanto das letras.

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  2. Quanta genialidade na composição desta crônica. Um belo retrato do cotidiano de vários brasileiros. Quando será que o quadro irá mudar em nosso país? Parabéns ao escritor estou ansiosa por mais textos, que o blog continue neste ritmo :)

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